sábado, abril 12, 2008

Doce armadilha


Certa feita fui ao Detran, resolver um assunto e tive que esperar algumas horas para ser atendido.
Já era hora do almoço e fiquei sabendo que havia um restaurante dentro do departamento, que atendia aos funcionários do orgão e aos visitantes. Como tinha que esperar mais algum tempo, fui até lá.
O restaurante era grande e de ambiente agradável. Estava bastante cheio e uma longa fila se formava diante do self-service, que tinha grande número de pratos visualmente deliciosos. Haviam várias mesas reservadas para delegados e diretores.
Depois de me servir, fui procurar uma mesa livre e ocupei uma perto de outra ocupada por quatro delegados.
Eles estavam todos vestidos de terno e conversavam animadamente. Lógico devia ser papo de delegados, policiais, crimes, infrações de trânsito e coisas afins. Até aí, tudo normal.
Foi quando reparei que havia um copo sobre a mesa deles e dentro do mesmo havia uma abelha presa por uma lata de refrigerante que lhe servia de tampa. A abelha voava debatendo-se entre as paredes de vidro e já devia estar rareando o ar dentro de tão pequeno espaço. Pobre abelhinha, havia caído naquela armadilha só porque procurava um pouquinho de doce e diga-se de passagem, não existe no mundo animal, criatura tão sagrada e útil ao homem, pois dá-lhe de comer, remédios e até mesmo a sua própria vida, servindo como agulha para injeção de seu veneno, nos tratamentos de acumpuntura.
A comida estava muito saborosa, mas aquela cena começou a me incomodar. Cheguei à conclusão que aqueles delegados deviam ser homens muito maus e que aquela tortura servia-lhes de diversão enquanto saboreavam tão apetitosa refeição.
Comecei a ficar completamente ansioso e já suava frio quando então achei que eu tinha a obrigação de salvá-la. Mas como? Não ficaria bem ir até à mesa e pegar o copo, pois eu nem traballhava lá. Pedir-lhes que soltassem a refém, muito menos, pois além de rirem de mim, poderiam querer me prender por me meter em assuntos da lei.
Foi então que veio até mim, uma garçonete que percebeu que eu precisava de algo
- Precisa de alguma coisa, senhor?- perguntou-me a garçonete
Quase sem conseguir falar e com uma nítida expressão de pánico, creiei coragem e lhe disse:
- Sim, preciso de um grande favor, está vendo aquela abelhinha presa no copo? Por gentileza, solte-a
para mim.
A garçonete então deixou rolar uma lágrima de seus olhos e prometeu-me salvar bichinho. Foi até à mesa, pediu licença aos delegados e cuidadosamente retirou o copo-prisão e com um gesto tranquilizador mostrou-me o que havia prometido e depois que eu à agradeci, retirou-se para finalizar à missão.
Com um suspiro de alívio, continuei a almoçar, feliz por ter salvado uma vida.
Depois de almoçar, quando estava na fila do caixa, a garçonete heroína, dirigiu-se à mim e antes que eu pudesse agradece-la novamente, me disse:
-Sabe porque aqueles homens fizeram aquilo? Eles são delegados e são muito maus...

4 comentários:

Rapha Vieira ou um dos seus alteregos disse...

Viva as abelhas soltas!

caarpdien9 disse...

Raphael, viva!
Abração!

Anônimo disse...

Pois é Carpiem diem, fico feliz por sua atitude e sensibilidade para com algo à primeira vista tão banal. Na UFMG em várias unidades as abelhas estão à solta, talvez pela própria perda gradativa de seu hábitat. Confesso-lhe que quando estou todo senhor de mim tomando o meu café e, neste momento, uma das várias abelhas chegam perto de mim, a primeira reação que me vem à cabeça é espantá-la. Tá certo que minha birra é com elas. Já com os gatos (talvez tantos quanto as abelhas) eu até gosto, muito embora a grande maioria deles seja muito arisco. Ao contrário das abelhas. Será que elas estão querendo demonstrar para mim que eu não preciso temê-las? Será que elas querem pousar alegremente no meu café e compartilhá-lo comigo? E eu, na minha soberba, simplesmente as desprezo...

Mas fique tranquilo, amigo Carpiem diem: meu olhar sobre as abelhas passará a ser outro depois de sua bela (e factual) estória. Não sei se serei imediatamente tão simpático com as abelhas como sou com os gatos, mas me esforçarei para tal!

Um abraço!

Luiz.

caarpdien9 disse...

Caro Amigo Luiz,
Primeiramente, é uma grande honra recebe-lo aqui. Seja bem vindo e a
casa é toda sua, sinta-se à vontade.
Tanto Gatos quanto Abelhas são seres dignos de conviver conosco.
É claro, ninguém gosta de levar picadas ou arranhões, mas, a gente pode levar coisa pior com a agradável convivência com seres humanos.
Viva os Gatos e as Abelhas soltas da UFMG.
Ps. Da próxima vez, tente começar um papo com uma delas.
Grande abraço.